in «Boletim da Ordem dos Advogados»


O SOBRE – ENDIVIDAMENTO EM PORTUGAL


Quando o consumidor pede ajuda junto do GAS, todos os créditos já se encontram em situação de incumprimento e já existe informação negativa na Central de
Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal

Nos anos 90 o endividamento dos consumidores português subiu significativamente. Vários fatores de ordem social e económica contribram para esse aumento acentuado, como é o caso da forte descida das taxas de juro para valores historicamente baixos, a perda de bitos de poupança, a manutenção de taxas de desemprego relativamente baixas e o crescimento económico. Outro aspeto relevante foi o da desregulamentação de que foi alvo todo o mercado de crédito no início dos anos 80, o que provocou um forte crescimento e o surgimento de novas entidades a concederem crédito, uma crescente inovação financeira e uma forte.
Competição entre a oferta. Paralelamente a estes fatores, houve outros aspetos de natureza económica que contribuíram para o aumento do endividamento das famílias.
O
recurso a crédito deixou de ter associada uma conotação negativa, decorrente de uma situação de pobreza ou de uma falha na condução da vida. A publicidade intensa e sistemática das instituições de crédito encorajou o recurso ao crédito, permitindo a sua vulgarização. Por outro lado, o crédito possibilita dissimular o estrato social, ao permitir adotar um estilo de vida característico de uma classe superior à sua, e para muitas famílias tornou-se uma forma corrente de geso dos seus orçamentos familiares.
Neste contexto, as famílias portuguesas anteciparam os seus rendimentos e endividaram-se não só com a compra da sua casa mas também com recurso ao crédito pessoal, nomeadamente para a aquisição do automóvel. Algumas famílias passaram a consumir mais do que o seu rendimento disponível, levantando a questão do sobreendividamento.
O sobre-endividamento não é uma questão recente, sendo que remonta ao início do ano 2000. Foi precisamente no ano 2000 que a Associação portuguesa para a Defesa do Consumidor - DECO criou os seus Gabinetes de Apoio ao Sobreendividado - GAS, com o objetivo de prestar apoio aos consumidores que se encontravam excessivamente endividados ou mesmo em situação de sobre-endividamento.
O consumidor que recorre à DECO para apresentar um problema de endividamento/sobre-endividamento deve preencher os seguintes requisitos: deve tratar-se de uma pessoa singular; estar de boa fé; estar na manifesta impossibilidade de fazer face ao conjunto das suas vidas não profissionais.
Desde logo, as dividas que não tenham sido contraídas no exercício da sua atividade profissional, ou seja, vidas não profissionais de um particular. As dívidas não profissionais dizem respeito aos compromissos assumidos pelo consumidor junto das instituições de crédito (bancos, 5FAC, leasing) ou de outro credor para satisfazer as suas necessidades e as do seu agregado familiar.
Em 2009, o Gabinete de Apoio ao sobreendividado da DECO foi reconhecido pelo Gabinete para a Resolução Alternativa de Litígios - GRAL, do Minisrio da Justiça, como Sistema de Apoio a Situações de Sobreendividamento (Decreto-Lei n.º 22612008, de 20 de Novembro, e Portaria n." 31212009, de 30 de março).
Os sistemas de apoio aos sobre-endividados representam um conjunto de mecanismos colocados à disposição dos mesmos por entidades cuja atividade tem como objetivo aconselhar, informar e acompanhar a elaboração de um plano de pagamentos através de procedimentos de conciliação ou de mediação. Assim, durante o processo executivo é possível detetar situações de sobre endividamento com:
A possibilidade de suspender a inclusão do registo do sobre-endividado na lista pública de execuções, quando este aderir a um plano de pagamentos e enquanto estiver a cumprir;
A possibilidade de suspender os processos de execução submetidos a centros de arbitragem, quando os mesmos digam respeito a devedores sobre-endividados.

Durante os 11 anos de existência destes Gabinetes foram inúmeras as famílias que pediram ajuda a esta associação. A principal razão apresentada pelas famílias para as dificuldades advém da diminuição dos rendimentos, decorrente de situações de desemprego. No entanto, para as dificuldades sentidas contribui também uma elevada taxa de esforço e a ausência de
poupança
, aliada à falta de literacia financeira do consumidor português.
Verifica-se, especialmente este ano de 2011, um crescente número de solicitações da parte dos consumidores, justificado desde logo pela atual situação sócio-económica, pela elevada taxa de
de
semprego, pelos cortes salariais e pelo aumento da Euribor.
Muitas das famílias que pedem ajuda à DECO (em 2010 foram mais de 17 mil famílias) fazem-no numa fase tardia, na qual, na maior parte das vezes, já existe processo judicial (processo de execução), e por vezes já estão a ser confrontadas com a penhora dos seus bens, situação em que não pode haver qualquer intervenção. Muitas outras situações, e em grande número, não apresentam qualquer viabilidade de reequilíbrio orçamental, atendendo à ausência de rendimento ou ao seu peso diminuto face ao passivo existente.
Desde 2004, data da entrada em vigor do Código da Insolncia, que as falias e pessoas singulares podem ir a tribunal requerer a sua declaração de insolncia. Constata-se com isto que os cidadãos recorrem cada vez mais a este processo como forma de evitar o(s) processo(s) de execução. As pessoas singulares, tal como as empresas (através do recurso ao plano de pagamentos), podem encontrar na insolncia a forma de conseguirem obter a recuperação. E podem fazê-lo de duas formas: recorrendo ao "Plano de pagamento" ou à "Exoneração do passivo restante". A resolução do problema do sobre-endividamento passa necessariamente pela combinação dos instrumentos de prevenção (uma aposta clara da educação financeira), como é o caso dos mecanismos de tratamento do sobre-endividamento.



Por: Natália Nunes, Gabinete de Apoio ao Sobreendividado


in «Dinheiro Vivo»


COMO EVITAR A INSOLVÊNCIA?

O percurso no direito da insolvência tem uma característica que se vem observando ao longo dos últimos vinte anos: sempre que a economia se encontra em crescimento há uma tendência para valorizar a liquidação da empresa que se encontra em situação económica difícil. Ao invés, quando a economia se encontra em curva descendente o ciclo legal tende para a reestruturação.



O ano de 2012 terminou, por isso, com aprovação e publicação de relevantes instrumentos legislativos orientados para a recuperação das empresas, ao mesmo tempo que se atingiu a um aumento de cerca de 400% (por comparação com período homólogo em 2007) no número de processos de insolvência entrados nos tribunais portugueses. Num altura em que a situação económica das empresas tende para a deterioração importa elencar os instrumentos disponíveis para a viabilização das empresas.  
Perante um cenário de dificuldade é sempre possível a reestruturação voluntária de créditos através do contacto com os credores para que se obtenha a consolidação ou a redução do passivo. Caso não seja possível este cenário a lei permite hoje, com a intermediação do IAPMEI, a adopção de um plano de recuperação da empresa que pode, posteriormente ser homologado judicialmente.
O SIREVE, (Sistema de Recuperação de Empresas pro Via Extrajudicial) sucede ao PEC (Procedimento Extrajudicial de Conciliação), pretendendo o legislador conferir maior celeridade ao processo anterior com a significativa redução dos prazos de decisão. Outra possibilidade de recuperação da empresa, esta verdadeiramente inovadora no nosso país, é aquela que o PER possibilita.
O Processo Especial de Revitalização situa-se na antecâmara da insolvência e possui já tutela judicial. Destina-se às empresas que se encontrem em situação económica difícil ou em insolvência meramente iminente, mas que ainda se encontram a cumprir. Por fim o legislador disponibiliza às empresas o Plano de Recuperação em Processo de Insolvência que implica a prévia declaração de insolvência. Porém, na minha opinião o governo não foi suficientemente ambicioso na reforma que fez dos meios preventivos da insolvência.
Faltam ainda duas medidas que são essenciais e que, curiosamente, não têm custos para os contribuintes, já tão depauperados.
A primeira é muito simples: Abrir imediatamente concurso para novos administradores judiciais. Os que existem são muito fracos e não têm qualquer capacidade para perceber a realidade da empresa (e os quatro ou cinco que são bons estão soterrados de processos). Se nos recordarmos do que a abertura do mercado aos notários fez pela qualidade do notariado, podemos perceber o impacto desta medida, que não deve custar mais do que umas centenas de euros.
A segunda medida: Dar verdadeiras garantias aos credores (maxime a banca) que apoiarem a empresa submetida a um dos processos de recuperação e não um mero privilégio de segunda linha, como o que agora foi determinado na lei.
Estou convencido que a performance da recuperação de empresas daria um salto gigantesco com a implementação destas pequeníssimas medidas. Voltando à realidade, temos de ter consciência que uma empresa que “não tem lugar” na economia deve ser rapidamente extinta, se não puder ser reconvertida para o exercício de uma actividade que acrescente valor. Não reconhecer este princípio básico é apenas adiar a fatalidade da insolvência. Mais, tal como em tantas outras realidades, o sucesso neste tipo de processos depende da antecipação, do planeamento, dos detalhes e... dos credores. Com a ponderada e adequada adição de todos estes ingredientes a recuperação das empresas financeiramente deficientes mas economicamente válidas é possível.



Por: Nuno Líbano Monteiro , Advogado

in «Dinheiro Vivo»


FAMÍLIAS PEDEM INSOLVÊNCIAS PARA ESQUECER DÍVIDAS À BANCA

Pedir a insolvência é a última hipótese de as famílias sobre-endividadas conseguirem ver perdoadas as suas dívidas. O número de pedidos tem aumentado e a Deco, ainda que não aconselhe esta opção, tem verificado cada vez mais casos em que não há outra saída possível. Natália Nunes, coordenadora do Gabinete de Apoio ao Sobreendividado, criado pela Deco para encaminhar portugueses em dificuldades, explicou ao Dinheiro Vivo que as dívidas das famílias à banca têm aumentado e que agora os portugueses veem-se obrigados a escolher uma saída alternativa. O problema, diz, é que "por vezes não há outra solução senão a insolvência".

Desde que a crise se instalou em Portugal, o número de pedidos de insolvência aumentou consideravelmente. Entre o primeiro trimestre de 2007 e o primeiro trimestre de 2012 houve um crescimento de 451,7% nos pedidos a darem entrada na justiça portuguesa. Os números são do Ministério da Justiça e sublinham dificuldades crescentes.
A Deco não perspetiva grandes melhorias para um futuro próximo. "Tendo por base aquilo que tem levado as famílias a entrarem em dificuldades - desemprego e cortes - e perspetivando-se tanto para o público como para o privado novos cortes, só podemos prever que o número de famílias com dívidas vá aumentar", afirma Natália Nunes.
É que, como explica, "as famílias organizaram os orçamentos com os vencimentos que tinham e não havia previsão de que a a sua situação mudasse". O orçamento estava muito contado e não admitia margem para cortes a subsídios, sobretaxas e redução dos pagamentos às horas extraordinárias, explicou a responsável.
Num contexto de dívida, o crédito à habitação é o maior problema dos portugueses e o que contribui mais para o aumento do malparado no País. Os números revelados pelo Boletim Estatístico do Banco de Portugal revelam que dos 136 017 milhões de euros emprestados às famílias portuguesas em agosto, 3,66% representam uma cobrança duvidosa. Ou seja, 4977 milhões de euros são crédito malparado. Por outro lado, e com mais 55% do que o registado em julho, a banca tem junto das empresas 6879 milhões de euros de cobrança duvidosa. Do total de 108 515 milhões emprestados às empresas, 9,8% são crédito malparado.
Este ano, as dificuldades têm sido mais visíveis. No Gabinete de Apoio ao Sobreendividado já entraram mais pessoas do que durante o ano passado inteiro. Só este mês, a Deco já recebeu mais de mil contactos telefónicos e já atendeu presencialmente mais de 300 pessoas com dificuldades para pagar as contas. O número de sessões de esclarecimento e ajuda já atinge os 4200 pedidos.
"Tem que ver com a austeridade, com o aumento do desemprego e com o não se estar a conseguir voltar ao trabalho tão rapidamente quanto se esperava", explica Natália Nunes. É necessário introduzir novos hábitos: "Os portugueses habituaram-se a ter seis créditos: o da habitação, dois cartões, dois créditos pessoais e mais um do carro", agora é necessário rever prioridades, até porque o acesso a empréstimos também tem caído a olhos vistos: menos 536 milhões de euros no mês de agosto, segundo o Banco de Portugal.

Por: Ana Maragarida Pinheiro

in «I Online»


ADMINISTRADORES DE INSOLVÊNCIAS QUEREM MAIOR RAPIDEZ DOS PROCESSOS E MENOS BUROCRACIA

Os administradores de insolvências defenderam a necessidade de maior rapidez nos processos de insolvências e criticaram o “bloqueio” que muitos destes processos têm nas secretarias e nos tribunais, num encontro realizado no Algarve.
Numas Jornadas de Estudo dos Agentes de Execução, que terminaram sábado à noite no Carvoeiro, no concelho de Lagoa, no Algarve, a Associação dos Administradores de Insolvências (AAI) defendeu a necessidade de “diminuir a burocracia e acelerar os processos”.
Existem centenas de processos e requerimentos que ficam semanas nas secretarias e não são despachados. É extremamente grave”, destaca, numa nota, o presidente da AAI, José Ribeiro Gonçalves, destacando que “a lógica é recuperar o que for recuperável”, mas “o facto de os tribunais não darem resposta nos tempos que a lei prevê não permite essa recuperação”.
A associação recomendou, por exemplo, que o agente de execução possa consultar “todos os dados fiscais do executado em processo que tenha título executivo válido, sem necessidade de intervenção do juiz”, destacando que este pedido de autorização judicial é exclusivamente burocrático e impõe “grande morosidade nos processos”.
Segundo a associação, fecharam quase 5.000 empresas desde o início do ano, o que tem trazido trabalho acrescido a estes profissionais.
Nas jornadas foi ainda defendido uma “estreita colaboração entre os vários operadores judiciários” e a revisão das leis penais, prevendo o agravamento da sanção penal em caso de agressão ao agente de execução, equiparando-o a oficial de justiça.
Segundo a Câmara dos Solicitadores, há em Portugal 1.100 agentes de execução.


Por: Agência Lusa